Em Ao Largo de Viareggio, pinturas, o artista Manuel Vilarinho vislumbra a paisagem, enquanto drama e tragédia. Através de Shelley, Byron e Keats, o pintor projeta-nos para uma experiência estética de sentimentos e vivências, memória e história, e locais, evocando Viareggio e Roma, cidades eleitas por excelência, onde subtilmente emergem da vida e da morte. Nesta série de pinturas, o passado entrança-se com o presente, e, simultaneamente, o presente retorna-nos ao passado. A memória surge fragmentada com pinceladas rápidas que expressam emoções trágicas da vida, que se lançam para a história. A pintura "relampeja" poiesis. No seu olhar erudito, a pintura transita da cor à mancha, do fragmento às inscrições. Entre pinceladas violentas e citações de poetas românticos, a vida dramática quotidiana transcede o estado de espírito do ser humano, onde a poiesis visual se funde com a poesia literária. Porventura, Vilarinho homenageia o seu legado poético de Shelley, Byron e Keats, mas o reconstrói, na tragédia e no caos, o drama do Pós-Modernismo. Na obra de Vilarinho, a paisagem expressa a «ordem da sensação», tal como afirma Deleuze (2003, p. 36), na medida em que a sensação passa de uma «ordem» para outra, de uma «área» para outra, de uma imagem para outra, numa sequência ou em séries. Através da história, aponta-nos a pequenos estilhaços de memórias fúnebres e de dor. O naufrágio de Shelley, a sua morte e a vida dos três poetas, que se cruzam em Itália e Grécia, misturam-se como sombras de memórias de uma única vida, cuja experiência estética carrega em si o drama. Contemplamos, assim, as obras Na Praia de Viareggio, 2017, ou No Naufrágio de P. B. Shelley, 2017. Shelley cujo corpo foi devolvido à costa, na praia de Viareggio, teve a sua última homenagem na cerimónia fúnebre organizada pelo seu amigo Byron; Keats, numa vida plena em Roma, morre jovem; e Byron como um espectro numa paisagem grega, where beauty cannot keep her lustrous eyes (cf. Ode to a Nightingale de Keats, in Guimarães [2010, p. 126]), uma inscrição na obra Paisagem com Palavras de Keats, 2011. E, em memória da irmã de Manuel Vilarinho, o último passeio em Roma, na obra Em Roma com Minerva (e minha irmã), 2014. Funde-se a história, permanecendo subtilmente abstracções e pinceladas dramáticas, onde a cor e a forma procuram uma distorção, por vezes, brutal na representação, cuja paisagem integra um ambiente quase orgânico, tal como em Greek Isle in Autumn (for Byron) #2 e #3, 2009. A cor transpira natureza. A natureza emerge do espírito, sendo o artista a própria natureza. Expressa o dinamismo pictórico e fragmentado, quebrando intencionalmente o conhecimento da história da pintura. Espelha uma «arte», enquanto sensação. Em Wild West Wind (for Shelley), 2010, a paisagem transparece o vento forte em pinceladas soltas, como se a própria natureza registasse a enorme intensidade do seu gesto selvagem, procurando uma rudeza da forma e do subjectivismo. O vento é o caos, onde a tragédia esboça constantemente o limiar do sentimento do ser humano. A pintura segue o seu próprio percurso, em que o espectador o encontra especificamente na sensação da forma, por sequências ou séries, em diferentes áreas do «sentir», através de pistas ou em pequenos retalhos, as imagens dilaceradas de uma cultura ocidental. A vida e a morte. |